Método simples, barato e seguro recupera ouro e outros metais do lixo eletrônico

11 de junho de 2014


por Elaine Nascimento

Ouro, prata, bronze, níquel, zinco e vários outros metais presentes em aparelhos eletrônicos e equipamentos de informática, e que acabam virando lixo, podem ser totalmente recuperados. De acordo com os professores do Programa de Pós-Graduação em Agroquímica da UFV, Luis Henrique Mendes da Silva e Maria do Carmo Hespanhol da Silva, “é possível recuperar esses metais com 100% de aproveitamento, utilizando sistemas aquosos bifásicos (SABs), um método economicamente viável, eficiente e que não causa danos à saúde e nem ao meio ambiente”. A recuperação dos metais evita que novos elementos sejam retirados da natureza, diminui a contaminação decorrente do descarte inadequado desse lixo e traz ganhos econômicos ao colocar de volta ao ciclo de produção recursos que já foram extraídos.

Os pesquisadores Luis Henrique e Maria do Carmo avaliam que a  retirada de metais da natureza pela indústria tem um fortíssimo impacto ambiental. Eles projetam que dentro de 30 a 40 anos terá um esgotamento de várias  fontes  e esses minerais vão estar por aí, dispostos no meio ambiente em produtos. Portanto, é um desafio estratégico ser capaz de criar métodos de recuperação que sejam simples, baratos e que não coloquem em risco a saúde das pessoas que vão aplicar. E os SABs atendem a todos esses requisitos

Com uma experiência de mais de doze anos aplicando esses sistemas, os pesquisadores explicam que os SABs podem ser utilizados para extrair vários materiais. Contudo, os resultados mais interessantes foram obtidos em aplicações para purificar metais. O sistema aquoso bifásico é formado em sua maior parte por água misturada com pequenas quantidades de sal inorgânico e polímero. Os pesquisadores explicam que se “você pegar um copo de água, adicionar sal e polímero, que é um pozinho branco,  e agitar, o sistema fica turvo como leite. Passados de 20 a 30 segundos, o sistema se separa em duas fases. Quando você coloca um extrato produzido a partir da abertura de uma placa metálica dentro desse sistema, o íon ouro extraído fica todo na parte de cima, e os outros metais ficam embaixo”.

Na prática a aplicação dos SABs seria assim: primeiramente a placa de metal deve ser triturada num moinho. Em seguida, deve ser tratada em ácido clorídrico, que dissolve essa placa formando um líquido colorido. Esse líquido tem quase 90% de água, basta acrescentar o polímero e o sal, que o sistema se separa em duas fases. O ouro vai puro para a fase rica em polímero e os outros elementos como o cobre, ferro, níquel, ficam na fase rica em sal. Para esses metais que ficaram embaixo, basta preparar outro sistema aquoso bifásico para cada um deles, trocando o polímero e o sal. Assim, se consegue purificar todos os metais com muita eficiência.

Além da alta precisão na extração dos metais, de acordo com os pesquisadores, o método é muito simples de ser aplicado: “Não precisa ser químico ou outro especialista. Com meia hora de treinamento, qualquer pessoa está preparada para aplicá-lo e sem correr nenhum risco porque não é tóxico”.  Diferentemente de outros métodos de extração, o sistema aquoso bifásico não causa nenhum dano à saúde. De acordo com os professores, é possível, por exemplo, extrair ouro com hexano e água, mas para isso é preciso usar um solvente altamente tóxico e exige toda uma formação por parte de quem vai aplicar.

A fácil aplicação do sistema aquoso bifásico vem atender à necessidade de se aproveitar ao máximo o lixo eletrônico disponível, independentemente de onde ele esteja: “Um indiano, um chinês ou um americano pode fazer. Já se gastou energia e recurso levando esses produtos onde eles se encontram. Não é economicamente viável concentrar todos esses materiais num único lugar para fazer o processamento. É interessante que a recuperação dos metais seja feita onde os produtos estão”.

A literatura indica que utilizando SABs, tudo o que acontece num béquer, em nível de laboratório, acontece em grande escala. Desde 2011, a equipe dos professores Luis Henrique e Maria do Carmo desenvolve um projeto em parceria com a Vale, baseado nesse método de purificação de metais.  A empresa está requerendo as patentes da aplicação desse sistema. “Eles sabem que estão trabalhando com uma pesquisa extremamente estratégica, vão fazer uma mineração de segunda ordem, extraindo metal dos produtos. Imaginamos que essa tecnologia será absorvida pela Vale” – avaliam os pesquisadores.

Além dos benefícios ambientais e econômicos do método, os professores manifestam uma preocupação pessoal no que se refere aos benefícios socais que a aplicação da pesquisa pode trazer: “Nós gostaríamos muito que fosse uma tecnologia para pessoas carentes porque mudaria bastante a relação de forças econômicas, daria oportunidade para pessoas socialmente desguardadas. Imagina se uma comunidade de catadores de lixo em Bagdá, Aracajú, Piauí ou qualquer outro lugar, puder acessar os lixos eletrônicos e, utilizando recipientes simples para aplicar o sistema aquoso bifásico, obter metais valiosos? Para nós, como cientistas e seres humanos, iria ser uma grande felicidade. Mas nós sabemos que há todo um processo de pesquisa árduo para isso se tornar realidade”.