Grupo de Pesquisa da UFV desenvolve ferramenta para melhor organização territorial

1 de setembro de 2016


Um dos maiores acervos rurais sobre assentamentos rurais do país está na UFV. É o que afirma o professor José Ambrósio Ferreira Neto, do Departamento de Economia Rural, coordenador do Grupo de Pesquisa Assentamentos, que possui dados de 125 assentamentos rurais do País, sendo 60 em Minas Gerais, 43 no Acre e 22 no Espírito Santo. Todas as informações, como estudo sobre mapas, decretos de criação, relatórios detalhados sobre aspectos do solo, fauna, flora e recursos hídricos dos assentamentos, são frutos de pesquisas desenvolvidas pelo grupo, em parceria com uma equipe multidisciplinar, composta por pesquisadores dos departamentos de Economia Rural, Engenharia Agrícola, Solos e Ciências Biológicas.

As ações do Grupo tiveram início há 18 anos e foram formalizadas na plataforma do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), em 2008. Desde a sua criação, são realizados trabalhos relacionados à reforma agrária e a temas ambientais, como associativismo, cooperativismo e desenvolvimento rural, sempre tendo como foco as questões sobre a transformação da estrutura fundiária e organização territorial.

Prova do seu reconhecimento foi o convite para coordenar um trabalho do Instituto Chico Mendes, em 2012, em 77 unidades de conservação de uso sustentável, de Santa Catarina até a divisa do Acre com o Peru. Na época, chegaram a ser aplicados cerca de 55 mil questionários, abrangendo 280 mil pessoas, com o objetivo de se fazer um diagnóstico socioeconômico dessas unidades. A partir das perguntas dos questionários foi possível estabelecer o perfil dos seus beneficiários, obter informações de caráter demográfico, como faixa etária, gênero, escolaridade, e também sobre infraestrutura das moradias, atividades produtivas, renda, acesso a políticas públicas e percepção das suas condições de vida nas unidades. De acordo com o professor José Ambrósio Neto, “como o questionário é um instrumento frio”, parte da equipe também foi em algumas reservas aplicar técnicas participativas, permitindo um contato mais próximo com as comunidades. “Com todo esse levantamento, o grupo passou a ter também um acervo que nenhum lugar do mundo tem sobre as reservas extrativistas brasileiras”, destaca.

Além disso, há 10 meses, uma estudante do Instituto Agronômico Mediterrâneo de Zaragoza, Espanha, está na UFV realizando sua pesquisa de campo nos assentamentos rurais atendidos pelo Grupo. Outros seis pesquisadores espanhóis também conheceram alguns dos assentamentos e, segundo Ambrósio, ficaram encantados com a experiência. Isso porque estavam diante de uma perspectiva oposta, já que o problema que dá origem ao assentamento no Brasil é a questão da concentração fundiária, enquanto na Europa é o contrário, há o minifúndio, com propriedades fragmentadas.

Inovação
A expectativa é de que o grupo de pesquisa expanda ainda mais a sua contribuição para a organização territorial do Brasil de outros países com a criação de um software inovador: o Sistema de Organização Territorial da Reforma Agrária e Planejamento Ambiental (Soter-PA). Ele permite uma melhor divisão territorial dos assentamentos ao equilibrar a produtividade com o número de hectares no momento da divisão de terras.

Como explica o professor, quando o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) desapropria fazendas, é retirado um espaço de reserva legal e o restante é dividido em lotes que as famílias receberão para produzir. Na área urbana essa divisão seria simples, mas na zona rural é feito o parcelamento sem ser considerado que em uma região o solo é adequado e em outra não. Assim, as famílias que recebem lotes improdutivos acabam sendo prejudicadas e abandonando o local.

O Soter-PA vem solucionar essa questão ao possibilitar que, a partir de mapas do local, seja feita a divisão de lotes com o menor desvio padrão entre aptidões, sendo mais homogêneos possíveis, com qualidade para a agricultura menos discrepante. Por exemplo, uma família receberá um lote de oito hectares e outra de 15 hectares, mas o lote menor será equivalente ao maior de acordo com o critério da aptidão escolhido, seja agrícola ou social.

Outra boa notícia é que, conforme o coordenador do grupo, o programa “é tão simples que uma pessoa com conhecimento mínimo de informática consegue utilizar”. Para isso, é necessário ter o mapa do local que será dividido em lotes e, a partir daí, simular o parcelamento da terra da melhor forma.

Os próprios pesquisadores do Grupo estão fazendo testes com o programa e já foi constatado que a divisão dos lotes do ponto de vista da qualidade das terras e da utilização de áreas ambientalmente importantes ficou melhor, contribuindo para a organização territorial mais sustentável do que a atualmente realizada pelo Incra. Por isso, o instituto já tem demonstrado interesse em utilizar o programa para a divisão de lotes novos.

Ambrósio ressalta que “tem total interesse em repassar o programa para outros países que estão enfrentando a reforma agrária, como Moçambique e Angola”. A justificativa “é evitar o erro de fazer assentamentos em áreas que não sejam apropriadas para isso, como ocorreu no Brasil”.

O programa Soter-PA está em fase final de testes e já possui Registro de Marca no Instituto Nacional da Propriedade Intelectual (INPI). O Grupo está providenciando a documentação para obtenção do registro de software no próximo ano, quando  passará a ser disponibilizado a qualquer usuário em seu site www.assentamentos.com.br. Os interessados em obter mais informações sobre o programa e ter acesso aos dados do acervo do grupo devem entrar em contato pelo e-mailambrosio@ufv.br.

Seminário
O Grupo Assentamentos busca ainda articular os trabalhos de pesquisa com as atividades dos estudantes de graduação e de pós-graduação nas temáticas Organização territorial, desenvolvimento sustentável e meio ambiente. Com esse objetivo surgiu o Seminário Internacional Brasil, Espanha e Portugal (Sibep), que reúne pesquisadores da área dos três países, a partir de uma parceria com a Universidade de Santiago Compostela, no Laboratório de Território, da Espanha.

Já foram realizadas quatro edições do seminário, duas na UFV, uma na Espanha e a última delas em Palmas (TO). A iniciativa buscou interiorizar o evento, permitindo que ele chegasse a um público que normalmente não tem a oportunidade de participar de palestras com pesquisadores internacionais.

A temática do IV Sibep, realizado em abril deste ano, foi o Planejamento Territorial e Desenvolvimento Rural Sustentável: Tendências e Desafios. Como conta o professor José Ambrósio (1º da esq. à dir., na fotografia abaixo), que também foi um dos organizadores do evento, a escolha da temática está associada ao local onde o seminário foi realizado, “já que Palmas é uma das regiões em que se está esgotando a fronteira agrícola, por isso era importante trazer esse tema para a discussão”.

Participaram do evento palestrantes da Espanha, Portugal, das universidades de Brasília (UNB), Santa Maria (UFSM) e três da UFV: Marcelo Leles de Oliveira (DER), André Luiz de Faria Lopes (Departamento de Geografia) e Sebastião Renato Valverde (Departamento de Engenharia Florestal). O IV Sibep teve o apoio da Universidade Federal do Tocantis (UFT), da Embrapa, Pesca e Agricultura, da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), da Sociedade de Investigações Florestais (SIF) e da Fundação Arthur Bernardes (Funarbe).

(Sabrina Areias)

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